Produtos de degradação
em medicamentos

Para iniciar esse tema, que para mim é um dos mais envolventes e interessantes dentro da indústria farmacêutica, vamos entender o conceito de produtos de degradação de um fármaco e o porquê eles são controlados nos estudos de estabilidade e na rotina de controle de qualidade do medicamento. 

Em um cenário mais abrangente há o universo das impurezas, que podem ser procedentes de diversas etapas que compõe o produto terminado. Imaginem aqui toda a síntese do IFA, a dos excipientes que comporão a formulação e todo o processo produtivo e cadeia de transporte até o medicamento chegar nas mãos do consumidor. 

Durante uma síntese química, principalmente se olharmos os mecanismos de reações orgânicas, dificilmente o rendimento será exatamente 100%, ou seja, todas as moléculas reagentes formaram exclusivamente a molécula desejada como produto. Sempre haverá resíduos dos reagentes (materiais de partida), resíduos dos solventes utilizados como meio reacional (solventes residuais), resíduo de catalisadores (geralmente são as impurezas metálicas), resíduo de substâncias intermediárias (quando a síntese ocorre em diversas etapas) e com toda a certeza, haverá também subprodutos da síntese, que são a formação de moléculas através de reações secundária, que são aqueles mecanismos menos prováveis de acontecer. Essas são as famosas IMPUREZAS DE SÍNTESE, que na grande maioria das vezes são controladas na matéria-prima. 

Quando olhamos para uma molécula, precisamos imaginar o quanto aqueles átomos que a compõe estão confortáveis em suas posições e o quanto suas ligações serão resistentes a qualquer perturbação sofrida tanto por agentes químicos quanto físicos. Aqui temos a estabilidade do IFA. Significa que a molécula do IFA pode sofrer ataques das moléculas de água ou até do oxigênio do ambiente, assim como podem não suportar um calor mais excessivo ou até incidência de luz. Além desses fatores citados, há também a possibilidade de interação do princípio ativo com os excipientes da formulação e/ou seus resíduos. Para todos esses casos então, temos a formação dos PRODUTOS DE DEGRADAÇÃO, já que são formados pela degradação do princípio ativo. 

A importância em se controlar essas impurezas é a famosa garantia de segurança e eficácia que um medicamento deve possuir. A quantidade desses compostos “indesejáveis” deve ser calculada de modo que não atrapalhe a ação do fármaco e, acima de tudo, que não seja uma quantidade tóxica ao paciente. Por isso, há guias nacionais e internacionais que orientam na determinação desses limites, dentre eles podemos citar a tão comentada RDC 53/2015 (ANVISA) e os Guias ICH Q3A e Q3B. Esses guias trazem os seguintes limites: 

Notificação: limite mínimo que a impureza deve ser reportada; 

Identificação: limite máximo que a impureza pode ser desconhecida, acima desse limite a estrutura química dela deve ser conhecida. Geralmente esse é o limite estabelecido nas especificações para “impurezas desconhecidas”; 

Qualificação: limite máximo que uma impureza de estrutura conhecida não precisa ter sua toxicidade avaliada, acima desse limite a impureza deverá passar por avaliação toxicológica. Geralmente esse é o limite estabelecido para “impurezas conhecidas” numa especificação; 

Um alerta que devemos ter além desses guias é a possibilidade de formação de substâncias potencialmente genotóxicas, mutagênicas e carcinogênicas, que estão ganhando cada vez mais o holofote das agências reguladoras de medicamentos. E não sem motivos! Hoje, com a evolução tecnológica, analítica e certamente do conhecimento científico voltados para o mundo farmacêutico, fica evidente que tais substâncias possam ser formadas durante a síntese ou por questões de estabilidade e, devido sua alta toxicidade é dever da indústria olhar para elas e garantir a segurança dos pacientes que fazem uso do medicamento. Para elas existem guias específicos, como o ICH M7 e, recentemente a ANVISA publicou para consulta pública o “Guia sobre o Controle de Nitrosaminas em Insumos Farmacêuticos Ativos e Medicamentos”. 

Agora, voltando o olhar para o lado analítico, os métodos desenvolvidos para o controle de qualidade do medicamento devem ser indicativos de estabilidade, o que significa que devem ser capazes de detectar e quantificar essas impurezas com precisão e exatidão. É por isso que durante o desenvolvimento do método analítico, tanto o IFA quanto o produto terminado são expostos a algumas condições severas de degradação, o que damos o nome de estudo de degradação forçada, justamente para forçar a formação desses possíveis produtos de degradação e assegurar que o método é seletivo o suficiente para essa quantificação. 

Assim como a seletividade é importante, a intensidade do sinal gerado pelo analito, que nesse caso são as impurezas, deve ser intenso o suficiente para que sua quantificação seja assegurada, por isso que nessas análises, geralmente o preparo da amostra é mais elaborado, passando muitas vezes pelo processo de concentração, isso visa aumentar a concentração das impurezas que, proporcionalmente aos outros componentes da formulação, é extremamente baixa. Imaginem, em uma conta rápida, que se temos um comprimido de peso médio igual a 100 mg, onde 50 mg corresponde ao ativo, teremos um limite máximo de 0,1 mg de impureza, dessa forma, o preparo de amostra deve visar uma concentração detectável das impurezas alvo. E é por isso que se faz necessária a leitura de um padrão no limite de quantificação do método (LQ), para realmente confirmar que o sistema utilizado para a análise está adequado para o propósito. 

Então em suma, dentro do universo de impurezas presentes no mundo da indústria farmacêutica, os produtos de degradação são aqueles formados a partir de reações e/ou interações do IFA com agentes físicos ou outros compostos presentes na formulação. Devem ser monitorados através de métodos indicativos de estabilidade e, dependendo de sua concentração e presença de alertas estruturais, devem também ter sua toxicidade estudada. 

E aí, conta para a gente aqui nos comentários, quais suas maiores dificuldades e problemas enfrentados durante a análise de impurezas? 

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